quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

'Isso ainda não parece ser demais para pedir.'

A carta já deveria ter chegado, olhei no relógio e ainda eram 11 horas, mas o carteiro passava ás 8. Eu não estava muito ansiosa, um pouco nervosa com toda essa tensão, mas eu queria logo pegar aquela carta e ler o convite que viria junto com ela.

Pior mesmo seria se a carta não viesse, se estivesse só o convite, sem nenhuma desculpa, nenhuma palavra, nenhuma recordação...Eu provavelmente não aguentaria, mas perdido em meus pensamentos nem percebi a presença da minha mãe, ela me fez lembrar que apesar da minha tristeza (como ela havia percebido, se estava tão disfarçada?) eu tinha que levar adiante.
Desci e olhei para a mesinha de telefone, cheia de correspondência, senti o palpitar do meu coração transpassar minha camisa, peguei todas as cartas, mas já era fácil prever qual dentre todas aquelas contas era a que eu procurava. O grande envelope prateado parecia ainda mais brilhante, abri e fiquei admirando o lindo convite em minhas mãos e as letras garrafais que melembravam o porque de tanta tristeza, meu coração disparou e achei que fosse perder o chão, mais uma vez, apenas me concentrei em lembrar de respirar e voltei meus olhos, ainda fechados, pro envelope, procurando aquilo que era preciso pra aliviar a minha dor. Achei o papel de caderno dobrado várias vezes, naquele formato de coração que ela adorava, parecia ter sido escrito as pressas, aquela letra que eu conhecia tão bem de outrora tão distinta, assim como o escritor.
Já sabia o que estaria escrito, li e reli aquela carta, procurando a peça que não encaixava, procurando o porquê de não ser meu nome naquele convite e nas últimas linhas aquilo que eu procurava: 'Isso ainda não parece ser demais para pedir.'
Simples palavras incompreensíveis pro mundo todo, mas não pra mim. Me lembrei daquele dia, há tantos anos, da nossa adolescência desperdiçada com livros bobos, mas principalmente aquele, especificamente aquele capítulo, que encheu nossos olhos de lágrimas, já surpreendidos pela confissão daquele amor impossível.
Ela chegou perguntando se eu já tinha chegado naquela parte, com a minha confirmação, disse que queria ler pra mim, pois era muito bonito. Ainda lembro dos olhos delas nos meus e da minha surpresa por ela ter decorado as palavras e recita-las pra mim. Nesse momento entendi, quão grande era o desejo dela pela única coisa que minha condição não me permitia dá-la. Ao terminar com aquela frase que jamais me esquecerei, choramos. Eu ainda tão diferente do que sou agora, nem havia feito minha escolha, apesar de minha alma já estar modificada. Nesse dia compreendi quão impossível seria aquele amor.
Choramos muito, ou talvez apenas o suficiente, e nos despedimos com um beijo desesperado e mais do que esperado, o único que demos apesar de tanto amor. Os anos se seguirão e mantivemos nossa amizade, com aquela paixão calada, afinal era a única coisa que infelizmente poderíamos ter. Quando a informei de minha decisão, de minha transformação ela não e perdou. Talvez não tenha entendido que fiz aquilo por ela, que só queria ser perfeito pra ela, não me arrependi e ela não me aceitou, tive notícias dela por uma amiga e as coisas ficaram por isso mesmo, hoje quase 5 anos depois da minha mudança recebo o esperado convite.
Meus pensaments saíram daquele passado tão distante e me lembraram do convite em minhas mãos já mollhado por minhas muitas lágrimas, olhei o nome daquele cara sortudo, um completo desconhecido que me roubava agora a única pessoa que eu amei e que 15 anos depois continuava amando e mal sabia ele o segredo que ela escondia, a grande razão que a levava a se casar com ele, que não era o amor incondicional. Mas uma vez tive que me lembrar de respirar e li a carta mais uma vez, pronto para o casamento que seria em algumas semanas e pronto pro encontro depois de 5 anos. Com o coração ainda apertado larguei aqueles papéis e voltei pro meu quarto, que ainda era da cor de quando eu era criança, aquele tom rosinha me deixava ainda mais deprimido. Fiquei em meu quarto com a incerteza de que acabava ali, o meu desejo parecia ser damias para pedir...

Um comentário:

Cassandra disse...

muito bom!!! (impressionada)